O CAMINHO DA SERPENTE

"Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo [...]".

"Ela atravessa todos os mistérios e não chega a conhecer nenhum, pois lhes conhece a ilusão e a lei. Assume formas com que, e em que, se nega, porque, como passa sem rasto recto, pode deixar o que foi, visto que verdadeiramente o não foi. Deixa a Cobra do Éden como pele largada, as formas que assume não são mais que peles que larga.
E quando, sem ter tido caminho, chega a Deus, ela, como não teve caminho, passa para além de Deus, pois chegou ali de fora"

- Fernando Pessoa, O Caminho da Serpente

Saúde, Irmãos ! É a Hora !


terça-feira, 12 de agosto de 2008

DÉCIMAS

linguagem vetusta
emplumada de pura

DÉCIMAS DO GENÉSIO PONTES


Visco branco e palmeirão
Vara de ouro e pilriteiro
O cardo-santo e rinchão
Fel da terra e noveleiro


Verónica e trepadeira
Feto-macho, valeriana
Tramazeira e verbena
Sanamuda e ulmeira
Mil folhas e cerejeira
Urze e selo de Salomão
Goivo e amor de hortelão
Canabras e avoadinha
Espinheiro e sargacinha
Visco-branco e almeirão

Betónica e pulmonária
Sanícula e tasneirinha
Sarão-curto e cavalinha
Pinheiro silvestre avelária
Pepino S.Gregório, aliaria
Douradinha e sabugueiro
Norsa-preta e alfeneiro
Nevada dos gatos, violeta
Luminária e faia-preta
Vara de ouro e pilriteiro

Erva S. Roberto, ficária
Tussilagem, salgueirinha
Trevo de água, carvalinha
Ninho de cuco, vulneraria
Silvão-macho e fumaria
Celidónia, dente-leão
Consola-real, urtigão
Feto real, morangueiro
O cardo-santo, rinchão

Alfazema e escrofolária
Alecrim e pimpinela
Erva terrestre e rosela
Cardo-corredor, saponária
Nevada, papoila ordinária
Mangerona, marmeleiro
Erva-férrea, algodoeiro,
Silva-macha, matricária
Pé-de-leão, paritária
Fel da terra, nevoleiro

3 comentários:

Anónimo disse...

Querido Platero,

Tu que me conheces e sabes o meu nome, e me reconheces pelas palavras, para além do rosto, diz-me que flor ou erva ou vegetal de comer ou de aproveitar ou de dar de comer ao pasto, melhor diz o ramo de cheiros que agora te ofereço. Sabes o nome dessas flores de cheiro? Sabes?


Um beijo

Anónimo disse...

Eu gostava de pedir para passear junto de tamanho jardim: com tantas flores, ervas, cheiros e vegetais...
A única pessoa que me ensinava a nomear o simples, o belo era o meu pai. Está sem poder...mas apanhava pinhões e com uma pedrinha partia-os para eu os experimentar. Foi assim a primeira vez. Depois ensinou-me a reconhecer as ervas com que se tempera a azeitona e o nome das urzes para eu poder falar com o campo e como com os outros jardins para eu, com as palavras, os namorar. E ensinou-me o que era a camarinha que aparecia num livro de adivinhas e enchia as férias e os domingos de sábios e secretos nomes para eu me enamorar. A si, que recupera essa memória pelo seu saber, mando o meu mais fundo agradecimento. Uma comoção cheia de cheiros e cores de ervas que guardo nas paisagens húmidas da memória.

platero disse...

o Director do Centro Cultural da Igrejinha pediu-me que desse uma olhadela pelas décimas do Genésio -que estão a entrar no prelo para impressão.
foi o que fiz, com a convicção de que o meu contributo até podia ter alguma utilidade.
a poesia popular do Genésio Pontes talvez nem seja, no seu conjunto, do meu particular agrado. Mas só este Mote:
"visco branco e palmeirão..."
deu logo para entender que estava perante uma coisa muito linda. Antológica mesmo:

uma parceria feliz entre um Garcia de Horta e, sei lá, por que não, um cheirinho de Cesário Verde.

nada me liga a esta preciosidade de literatura popular a não ser a sorte de poder estar a contribuir, mesmo que de maneira modesta, para o tornar conhecido do maior número possível de pessoas.

nem tanto para o lerem quanto para lhe sentirem os cheiros e admirar as cores